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SAÚDE
Quarta - 02 de Novembro de 2016 às 10:38
Por: Do G1

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Foto: Felipe Dana / AP Photo

Um ano após os casos de microcefalia aumentarem de forma súbita e misteriosa no país, já se sabe que a zika foi a responsável pelas malformações. Enquanto famílias se esforçam para dar assistência a mais de 2 mil crianças com microcefalia, a ciência busca meios de combater o vírus.

Ainda longe de pôr fim à epidemia - que teve mais de 200 mil casos notificados no país só este ano - o governo evoluiu no atendimento dos casos de microcefalia, ou mais especificamente, na síndrome congênita do zika.

Essa síndrome, reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), é um conjunto de malformações e problemas apresentados por bebês que tiveram mães infectadas pelo vírus da zika durante a gestação. A microcefalia é só uma das consequências. As crianças também podem ter o sistema nervoso central afetado, apresentando epilepsia, deficiências auditivas e visuais, prejuízo no desenvolvimento psicomotor, bem como efeitos negativos sobre ossos e articulações.

Os estados de Pernambuco, Bahia e Paraíba são os que mais registraram casos de microcefalia desde o início da epidemia. As famílias lutam para aprender a cuidar e a melhorar a vida dos filhos.

É o caso da pernambucana Germana Soares de Amorim, de 25 anos, mãe de Guilherme, nascido no dia 19 de novembro de 2015. Para dar conta da criação do filho, ela precisou largar o emprego.

A descoberta da malformação do filho foi traumática. “Quatro dias antes de Guilherme nascer foi que surgiu na mídia a associação entre o zika e a microcefalia. Então, calculei: estou grávida e peguei a zika. Será? Mas descobri a microcefalia dele só no nascimento. Isso me abalou muito, mas não na questão de ter um filho deficiente. Imaginava a sociedade em que a gente vive e, na falta de assistência que existe, como seria o futuro dele. Então, me penalizava por querer o melhor para ele e não ter estrutura para oferecer. Desabei”, relembra Germana.

Na fila para exames do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (HUOC), no Recife, ela conheceu outra mãe de bebê com a malformação. Juntas, criaram um grupo no Whatsapp para reunir outras mães. Em dois meses, o número de participantes chegou a 200 - esse foi o passo inicial para a criação da União de Mães de Anjos (UMA), que hoje reúne 319 mães.

“A UMA foi um divisor de águas na minha vida. O grupo era para tirar as dúvidas, compartilhar experiências, e a gente começou a ver que tinha algo em comum entre a gente: essa falta de uma assistência adequada. Então, a gente resolveu formalizar e ir em busca de uma política de atendimento de qualidade, que está em construção. Fomos em busca dessas mães, inclusive do interior”, conta Germana.

Desde novembro de 2015, quando o Ministério da Saúde declarou estado de emergência, o governo federal passou a acompanhar semanalmente os casos de microcefalia, zika, e outras consequências do mosquito vetor, o Aedes aegypti. O Plano Nacional de Enfrentamento à Microcefalia foi criado e uniu ministérios, órgãos federais, estaduais e municipais.

Em Pernambuco, estado com mais casos, 26 unidades estaduais de saúde passaram a tratar crianças com microcefalia e oferecer atendimento psicossocial, quando antes apenas duas, por exemplo. Enquanto era difícil saber como a doença iria se expandir, as famílias dos primeiros bebês que nasceram com microcefalia lutaram para garantir o atendimento adequado às crianças.

Após sair do emprego para ter o tempo necessário para acompanhar o tratamento do filho, Germana recebe o Benefício de Prestação Continuada (BPC) desde março deste ano, dois meses após a criação desse auxílio do governo federal para mães de bebês com microcefalia no valor de um salário mínimo por mês.

“É tudo muito novo sobre o zika em comparação com outras causas de doenças congênitas. É um fenômeno que não aparece escrito em nenhum momento na literatura científica nacional e internacional”, aponta a médica infectologista Regina Coeli, do ambulatório de Doenças Infectocontagiosas e Parasitárias (DIP) Infantil do HUOC.

No ambulatório onde atua, cerca de cem crianças com microcefalia são atendidas e acompanhadas regularmente, entre elas Guilherme. Todas estão em investigação constante, incluindo as que têm diagnóstico de microcefalia confirmado ou descartado.

Além das dificuldades para garantir o tratamento adequado aos filhos, algumas das mães ainda não têm a colaboração dos pais das crianças. Essa é a situação de Camilla Raquel, da Paraíba, que se separou do marido quando estava grávida de quatro meses. Hoje, ele visita a criança rapidamente e, segundo a mãe, logo se estressa com os choros de Maria Lys, que tem oito meses.

"Só porque sou a mãe, tenho que cuidar sozinha?", pergunta. Dessa forma, o pai de Lys vai se distanciando, diz Camilla. “Ele não tem a rotina que eu tenho. É difícil não ter esse apoio. Se ele convivesse mais comigo, iria entender mais as necessidades”.

Na Bahia, segundo estado com mais casos, Ingrid Graciliano Cirne Guimarães, de 26 anos, tem a ajuda do companheiro, mas diz que “quem sofre mais é a mãe”.

“A família deu o apoio que tinha que dar, mas quem realmente sentiu fui eu, com uma rotina exaustiva. Se a gente não tiver amor de verdade, a gente não consegue cumprir nossa agenda. A família deu apoio. Só contei quando ela nasceu. Muda a vida da gente. Tive que me reinventar.” disse.

Ingrid não tem recebido Benefício de Prestação Continuada (BPC), pois não o solicitou.





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